A Vale pretende investir até US$ 100 milhões para desenvolver uma planta industrial de concentração magnética a seco de minérios de baixo teor de ferro. A tecnologia brasileira, conhecida pela sigla em inglês FDMS (Fines Dry Magnetic Separation), é única no mundo e foi desenvolvida pela New Steel, empresa comprada no fim de 2018. A capacidade da planta, que deverá ser instalada em Minas Gerais, será de 1,5 milhão de toneladas por ano. O start up do projeto está previsto para 2022. A Vale estima que, em 2024, 1% de toda a produção da empresa seja feita por meio do uso da tecnologia, que já tem patente reconhecida em 59 países.
Com a New Steel, a Vale estima que, em 2024, 70% da produção seja beneficiada a seco ou a umidade natural, sem adição de água no processo de beneficiamento e sem uso de barragens de rejeito. Hoje, o percentual de minério de ferro processado a umidade natural pela empresa chega a 60%. Dos 30% da produção a úmido restantes em 2024, porém, 16% terão rejeitos filtrados e empilhados a seco. Apenas 14% da produção continuará sendo processada pelo método convencional, de concentração a úmido e destinação em barragens ou cavas de minas desativadas, como é feito hoje com 40% da produção. Para isso, a Vale vai investir nos próximos anos US$ 1,8 bilhão na filtragem e no empilhamento a seco. As primeiras operações a utilizar a técnica serão as operações de Vargem Grande, em Nova Lima; Pico, Cauê e Conceição, em Itabira; e a mina de Brucutu, em São Gonçalo do Rio Abaixo.
Segundo o presidente da New Steel, Ivan Montenegro, no segundo trimestre entrará em funcionamento uma planta-piloto de FDMS no Centro Tencológico de Ferrosos (CTF), em Nova Lima (MG), investimento que totalizou cerca de US$ 3 milhões. A unidade será capaz de concentrar 30 toneladas por hora de minério a seco, utilizando a tecnologia de separação magnética, feita por meio de imãs de terras raras.
Pelo processo, a New Steel consegue entregar um concentrado de até 68% de teor de ferro, a partir de minérios pobres, com até 40% de ferro, dependendo de sua composição química e mineralógica. Atualmente, essa concentração é realizada pelo método conhecido como flotação, que usa água. Na flotação, o rejeito é usualmente depositado em barragens. Com a tecnologia de concentração a seco da New Steel, os rejeitos serão empilhados. A empresa já estuda formas de utilizá-los como insumo na indústria de construção civil, além de outras iniciativas como coprodutos.
O projeto-piloto no CTF é o segundo realizado pela Vale. Entre 2015 e 2017, uma planta similar operou com sucesso na mina de Fábrica, em Minas Gerais. O presidente da New Steel explica que os bons resultados foram fundamentais para que a Vale enxergasse o potencial do FDMS. A tecnologia, no entanto, vem sendo testada desde 2013. Na época, os equipamentos permitiam concentrar à taxa de cinco toneladas por hora, pasando para 15 toneladas em 2015 até chegar a 30 toneladas em 2017. A empresa trabalha no desenvolvimento de separadores magnéticos de grande capacidade, de até 100 toneladas por hora, para fazer frente aos projetos futuros da Vale.
Segundo o diretor-técnico da New Steel, Mauro Yamamoto, mais de 10 mil amostras de testes com minérios do quadrilátero ferrífero já foram analisadas pela empresa. Yamamoto destaca que hoje, com a tecnologia, já é possível atingir uma eficiência de recuperação de 90% do minério de ferro contido em uma jazida de baixo teor. Atualmente, a New Steel busca reduzir os custos de operação, por meio do uso de microondas industriais na secagem do produto. A intenção é substituir os secadores a gás natural, reduzindo, assim, o custo de energia a metade. “O processo já é sustentável e temos o desafio de torná-lo mais competitivo”, explica Montenegro.
Beneficiamento a seco
O diretor da Cadeia de Valor de Ferrosos da Vale, Vagner Loyola, ressalta que a Vale vem desenvolvendo tecnologia para aumentar o processamento a seco na empresa há anos. Na última década, por exemplo, foram investidos US$ 17,8 bilhões para instalar e ampliar o uso do processamento a seco – ou umidade natural – do minério de ferro produzido em suas operações no Brasil. Nos cinco próximos anos, a estimativa é aplicar mais US$ 3,1 bilhões em instalações de processamento similares para chegar à meta de 70% da produção a seco.
No Pará, no chamado Sistema Norte, cerca de 80% da produção já ocorre desta forma. A principal usina de Carajás, a Usina 1, está em processo de conversão para umidade natural: das 17 linhas de processamento da planta, 11 já são a seco e as seis linhas a úmido restantes serão convertidas até 2023. As plantas de tratamento de Serra Leste, em Curionópolis, e do S11D, em Canaã dos Carajás, também não utilizam água no tratamento do minério. No S11D, por exemplo, o uso da rota de processamento à umidade natural permite reduzir em 93% o consumo de água quando comparado com um projeto convencional de produção de minério de ferro. A economia de água equivale ao abastecimento anual de uma cidade de 400 mil habitantes.
Em Minas Gerais, o processamento a seco foi ampliado de 20%, em 2016, para 32%, em 2019. Hoje, esse tipo de processamento está presente em diversas unidades, como Brucutu, Alegria, Fábrica Nova, Fazendão, Abóboras, Mutuca e Pico. “Nas operações de Minas Gerais, todas as unidades que poderiam passar para a produção a seco, já passaram. Por isso, estamos recorrendo a filtragem e o empilhamento de rejeitos e à tecnologia da New Steel de concentração a seco para reduzir o uso de barragens”, explica Loyola.
O processamento a seco está vinculado à qualidade do minério de ferro extraído na frente de lavra. Em Carajás, como o teor de ferro já é elevado (acima de 65% de ferro), o material somente é britado e peneirado, para ser classificado por tamanho (granulometria). Já em Minas Gerais, em algumas minas o teor médio é de 40% de ferro, contido em rochas conhecidas como itabiritos. Para aumentar o teor, o minério é concentrado por meio de beneficiamento realizado com água, sendo o rejeito depositado em barragens. O minério de alto teor resultante do processo pode ser, então, transformado em pelotas nas usinas de pelotização, aumentando o valor agregado do produto.
As usinas que operam a seco em Minas dependem da disponibilidade de minérios com teores mais altos – em torno de 60% – ainda encontrados em algumas minas do Estado. Para atingir a qualidade necessária e ser incorporada no portfólio de produtos da Vale, é necessária a blendagem (mistura) com os minérios de Carajás, realizada nos centros de distribuição da Vale na China e na Malásia.